7° capítulo A Viagem a São Salvador


Manuel não tinha a menor noção de como chegar a Salvador da Bahia.
E não escondeu isso de seus moços.
João, o mais safo deles, foi logo dizendo que não tinha importância porque “todos os caminhos levavam a Santiago”, numa clara alusão a Compostela e numa demonstração de fé.
Foram andando andando e andando.
Numa encruzilhada encontraram um Ancião sentado nas escadas do Cruzeiro.
“Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo”, falaram em uníssimo os moços em saudação.
“Louvado seja”, respondeu o velho homem.
“Vossa Mercê, poderia nos indicar o caminho para São Salvador?”
“Com muito gosto”, respondeu o senhor de barbas brancas como a neve, completando “É só seguir o caminho que o sol se põe”.
“ Perto daqui tem uma Parada que o dono é meu conhecido, peça a eles umas mulas para continuarem o caminho, em meu nome, e ele as fornecerá”.
“ Senhor, como é seu nome”, perguntou Manuel.
“É Cristóvão”.
E apoiado em seu cajado, com certa dificuldade, o ancião levantou-se.
Diante do Ancião ereto os moços tiraram os chapéus, se curvaram, numa demonstração de grande respeito, e vendo aquilo, já que não tinha chapéu, Manuel se curvou como se estivesse frente a El-Rey.
Ficaram ali, parados, vendo o Ancião apoiado em seu cajado, sumir na poeira do caminho contrário ao que eles iam seguir.
Andaram alguns bons quilômetros e encontraram a Parada de Tropeiros.
Tinha um índio sentado no portão que dava para o pátio interno.
O saudaram e receberam um comprimento que nada mais foi do que dois dedos na aba do chapéu.
“ O de casa”, gritou Manuel.
Lá de dentro saiu um senhor jovem que era só sorrisos, reinol, que logo foi se congratulando com os patrícios que ali estavam de pé e mortos de cansados.
“Bons dias, bons dias.”
“Em que posso ser útil a Vosmicês?”.
“Meu nome é José, natural de Lamas de Orelhão, e por aqui me chamam de Zé.”
“Senhor José. Encontramos um velho amigo seu de nome Cristóvão, que nos informou que Vosmecê poderia nos ajudar com mulas, pois precisamos chegar a Salvador”.
José de Lamas de Orelhão, como agora assinava seus documentos no Brasil, ficou sério, compenetrado, e cerimoniosamente disse:
“ Vossas Mercês são mais do que benvindas a minha casa. O que queiram está ao dispor. Vou mandar esquentar agua para se lavarem, enquanto preparo acomodações para o pernoite”. 
“ Mandarei o Índio preparar as mulas para amanhã pela manhã logo depois do pequeno almoço, está a gosto esta hora? ”
Espantado com a deferência, Manuel concordou com tudo.
“ Se posso perguntar donde veem os amigos? ”
“ Daquelas bandas onde o Sol nasce, das terras que vão até o Mar Oceano”.
“ Ah! Da sesmaria abandonada de Dom Gonçalo de Melo”, e calou-se.
Foi assim que Manuel Leite soube de quem era a casa e as terras abandonadas.
Se lavaram, comeram, dormiram, tomaram uma lauta refeição matinal, e foram ver as mulas.
Elas eram as melhores do estabulo, e Manuel perguntou o preço e o custo da hospedagem.
José respondeu de maneira surpreendente:
“Para qualquer negociação com as terras procurem por Dom Diogo Luís de Oliveira, Conde de Miranda, que é o governador, em nome do senhor Cristóvão”.
“De a ele, também em nome do senhor Cristóvão, uma boa importância para a construção e uma nova Igreja, já que a Sé de Salvador da Bahia está destruída por causa da invasão holandesa, e pela falta de um Bispo.”.
“Isso não está certo”, falou Manuel.
“Comemos de sua comida, estamos com as suas mulas, e isso custou dinheiro para Vosmecê”.
“Eu dou a esmola que o Vosmecê quer que eu dê, mas tenho que pagar pelas mulas. Lá isso tenho, porque não é justo”.
Foi uma briga de fosse no escuro, mas afinal Manuel pagou pelas mulas.
Os quatro moços assistiam tudo, e se entreolharam com olhos de aprovação.
Mateus, o mais velho, sussurrou entre eles;
“Esse Manuel é homem justo, será temente a nosso Deus?”
Mateus, Marcos, Lucas e João, se entreolharam novamente e se calaram.
Cumprimentos trocados, lá foram os 5 viajantes para  Salvador da Bahia.

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